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quarta-feira, agosto 11, 2004


Seu Rogério

Ganhei, um dia desses, um livro. A pessoa que me deu esse presentinho não me conhece muito bem, e resolveu me fazer um agrado, sem antes tentar entender quem eu sou. Se tivesse feito isso, teria mudado de idéia sobre o tal presente. O livro conta historinhas sobre soldados, durante a segunda guerra mundial. Adoro livros, mas sem essa de guerra. A coisa que eu mais odeio no mundo é guerra, e militares. Isso vem de quando eu virei gente grande, e aprendi a pensar. Não acredito em matar pessoas, não acredito em violência. Conheço o papo clássico: se não tivesse gente pronta a lutar, a europa estaria falando alemão. Tudo bem, tudo bem. A europa seria toda loirinha. E eu amo morenos. Mas tudo bem. Não tenho um argumento lógico, mas não acredito em guerras.

Um dia, quando era adolescente, minha mãe entrou no meu quarto pra anunciar que meu avô tinha morrido. Na verdade, eu já sabia. Seu Rogério ficou com cancer. Seu corpo foi parando de funcionar, pouco á pouco. Eu já tinha me despedido dele. Lembro muito bem da última vez que vi meu avô. Ele estava na cama dele, no sítio onde passou a ultima parte de sua vida. Ele não acreditava em hospitais, e tubos e remédios. Resolveu morrer em casa, tranquilo. Sai do seu quarto, e fui assistir o por do sol do lado de fora, na balança que eles colocaram na árvora na frente de sua casa. Enquanto observava o céu mudando de cor, pensava no meu avô.
Tenho pena d'ele ter morrido quando eu era jóvem. Porque queria ter conversado com ele agora, que sou gente grande, com ideias formadas. Na época eu não pensava em muita coisa além das preocupações clássicas de adolescentes. Mas agora penso muito como ele.
Seu Rogério nasceu durante a Primeira Guerra, na França. Seu pai era soldado. Lutou lá na frente, defendendo sua pátria. Presenciou coisas horriveis. Foi ferido, e ficou um bom tempo no hospital. Quando se recuperou, o colocaram pra dirigir ambulâncias. Foi lá que ele viu coisas piores ainda. Quando voltou pra casa ensinou o filho o que aprendeu: Nada disso vale a pena. Faça o que quiser na sua vida, mas nunca, nunca, vá pra guerra.
Quando meu avô fez 18 anos, estava na época da Segunda Guerra. Convidaram ele pra fazer seu serviço militar. Ele disse não. Não acreditava em militares, não acreditava em armas, não mataria outro ser vivo por nada nesse mundo. Muito menos pra defender uma pátria delimitada por fronteiras que não existem na natureza.
Colocaram ele na prisão. Quando foi solto, enviaram ele de volta ao serviço militar. Ele se recusou, foi preso outra vez. Isso aconteceu três vezes. Na terceira vez que o soltaram, pegou um navio pra Inglaterra, e jogou seu passaporte francês no mar. Nunca mais voltou ao seu país, nunca mais viu sua mãe.
Na Inglaterra, conheceu minha avó, fez um filho. Depois se juntou a um grupo de pacifistas, que fugiram da Europa, e foram fundar uma comunidade no Paraguai, país que aceitou um bando de jóvens sem documentos, e sem dinheiro. Fez mais 11 filhos, entre eles, meu pai.
Não sei o que ele diria ao saber que moro no seu país, que aprendi sua língua. Mas acho que ele ficaria feliz em saber que sua neta continua pacifista como ele. E que tem arrepios ao ver meninos vestidos com roupas militares, carregando máquinas de matar pessoas, e executando órdens que nem entendem. Ficaria feliz de saber que sua neta não consegue ler livros sobre soldados e guerras que matam mas não resolvem nada.




Bruna 2:36 PM



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